sábado, 18 de outubro de 2025
CRÔNICA

A Arte de Suportar com Amor

17/10/2025
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Pr. Pedro R. Artigas
Igreja Metodista

Na fila do mercado, uma senhora de cabelos brancos discutia com o caixa sobre o preço de um pacote de arroz. A diferença era de centavos, mas a convicção dela era de ouro. Atrás dela, um rapaz bufava, impaciente, olhando o relógio como se o tempo estivesse prestes a explodir. Mais atrás, uma mãe tentava acalmar o filho que chorava por um chocolate. E eu, no meio de tudo isso, lembrei de Efésios 4:2.
“Sejam completamente humildes e dóceis, e sejam pacientes, suportando uns aos outros com amor.”
É curioso como uma fila de supermercado pode ser um campo de treinamento espiritual. Ali, entre carrinhos e promoções, somos desafiados a praticar a humildade, a mansidão e, sobretudo, a paciência. Mas o que mais me chama atenção nesse versículo é a palavra “suportar”. Não no sentido de “aguentar com cara feia”, mas no sentido de sustentar, de carregar o outro quando ele está pesado demais para caminhar sozinho.
Vivemos em tempos em que a paciência virou artigo de luxo. Queremos tudo para ontem, com um clique, sem ruído, sem atrito. Mas a vida real — aquela que pulsa fora das telas — é feita de gente imperfeita, de atrasos, de falhas, de mal-entendidos. E é aí que Efésios 4:2 se torna mais do que um versículo bonito: ele vira um convite à contracultura.
Ser humilde quando se está certo. Ser dócil quando se é provocado. Ser paciente quando tudo dentro de você grita por pressa. Suportar o outro quando ele parece insuportável. Isso não é fraqueza — é força refinada. É maturidade espiritual. É amor em ação.
Lembro de uma vizinha que, toda manhã, varria a calçada com um cuidado quase cerimonial. Um dia, um garoto passou correndo e chutou a poeira de volta. Ela apenas sorriu e disse: “Ele ainda vai aprender.” Não havia ironia, só esperança. Aquilo me ensinou mais sobre paciência do que qualquer sermão.
Suportar uns aos outros com amor é também reconhecer que, às vezes, somos nós os insuportáveis. Que também erramos, também atrasamos, também falamos sem pensar. E que, quando isso acontece, precisamos de alguém que nos olhe com misericórdia, não com julgamento. Alguém que nos suporte.
Efésios 4:2 não é um chamado à passividade, mas à presença. À presença amorosa que escolhe não revidar, que escolhe ouvir antes de responder, que escolhe perdoar antes de condenar. É um lembrete de que o amor não é apenas sentimento — é decisão. E, muitas vezes, é uma decisão difícil.
Na fila do mercado, a senhora finalmente foi embora, o rapaz passou resmungando, a mãe comprou o chocolate. E eu fiquei ali, com o versículo ecoando na mente. Talvez suportar com amor seja isso: enxergar o outro como alguém em processo, assim como eu. E, nesse processo, oferecer graça.
Porque no fim das contas, todos estamos na mesma fila — a da vida. Uns mais apressados, outros mais distraídos, alguns mais carentes. E todos, sem exceção, precisando de um pouco mais de paciência, de humildade, de amor.
Já pensou em suportar alguém hoje, ou será que você é quem precise de que alguém o suporte? Shalom.