
Pr. Pedro R. Artigas
Igreja Metodista
Na correria dos dias modernos, onde o relógio parece sempre estar atrasado e as preocupações são entregues em domicílio como boletos, há um versículo que se recusa a envelhecer: “Em paz me deito e logo adormeço, pois só tu, Senhor, me fazes viver em segurança.” Salmo 4:8.
Essa frase paira suave como uma brisa de fim de tarde. Parece simples — deitar e dormir com tranquilidade. Mas quem nunca travou uma batalha silenciosa com o travesseiro? Pensamentos desfilando como carros de escola de samba, luzes apagadas e a mente acesa, planejando, revivendo, temendo.
O salmista, Davi, escreveu essas palavras em meio a tempos difíceis. Enquanto enfrentava conflitos, ele ousou confiar em algo que transcendia a instabilidade ao seu redor. Dormir, naquela época, não era apenas repousar o corpo — era se permitir ser vulnerável num mundo inseguro. E mesmo assim, ele encontrou descanso.
Hoje, dormimos com portas trancadas, alarmes ativados e câmeras que enxergam no escuro. Ainda assim, há noites em que o maior perigo não está fora, mas dentro da cabeça: ansiedade, medo do fracasso, dor da perda, arrependimentos tardios.
O que Davi parece ter descoberto é que segurança não é apenas questão de geografia ou tecnologia. É um estado de alma. A paz que ele menciona não vem de um travesseiro ortopédico ou de um colchão de molas ensacadas. Ela brota da confiança. Não em si mesmo, nem nos outros, mas em Deus.
Confiança é esse salto invisível sobre o abismo das incertezas. É saber que, mesmo quando tudo ao redor está fora de controle, há um lugar secreto onde o coração repousa. Quando a fé se torna cama, o medo tira férias. Quando a esperança cobre os olhos, os monstros se escondem.
Há quem diga que dormir bem é privilégio de quem tem a consciência limpa. Mas também é dádiva para quem descobriu que não precisa carregar o mundo nas costas. Davi não nos convida à irresponsabilidade — ele nos convida à entrega. A entrega de tudo que não podemos controlar, ao único que pode.
Na prática, talvez seja deixar o celular de lado antes de dormir. Ou trocar aquele último scroll pelas últimas palavras de uma oração sussurrada. Talvez seja respirar fundo, agradecer pelo que deu certo e confiar o que falta. Porque a paz não precisa de barulho para funcionar. Às vezes, o silêncio é seu idioma.
Que esta crônica seja como um cobertor espiritual para sua noite. Que, ao fechar os olhos, você lembre que a paz não depende do mundo lá fora, mas da segurança que habita dentro. E que, como Davi, você possa dizer: “Em paz me deito e logo adormeço.”